“Autor e obra” com Pino Boero (UniGe) e Luciano Migliaccio (FAU-USP) (tradução simultânea) https://youtu.be/J4OWQvhfxt8
Para comemorar o centenário do nascimento do escritor Gianni Rodari, o Instituto Italiano de Cultura de São Paulo realizará, durante a Settimana della Lingua Italiana nel Mondo, o ciclo de conferências online “Cem Anos de Gianni Rodari: a criatividade é para todos!”, que contará com dois encontros virtuais, nos quais serão apresentados ao público a obra e o legado do educador e escritor Gianni Rodari, que inovou na literatura para a infância e foi o primeiro italiano a receber o Prêmio Hans Christian Andersen.
Para apresentar e discutir a relevância do autor e seu trabalho, na primeira conferência:
Pino Boero, professor da Università di Genova, na Itália, estudioso de literatura infanto-juvenil e especialista rodariano, autor do livro “Una storia, tante storie: guida all’opera di Gianni Rodari” (Einaudi) e curador da mostra “C’era due volte il Barone Lamberto”; e Luciano Migliaccio, professor de História da Arte junto ao Departamento de História da Arquitetura e Estética do Projeto da FAU-USP. O encontro será mediado por: Michaella Pivetti, designer gráfica e escritora.
Live nos canais Facebook (interativo) (https://www.facebook.com/IstitutoItalianoDiCulturaSanPaolo?fref=ts ) e YouTube
(https://www.youtube.com/channel/UCPA4DNtwxdoIznicL88_9wg ) dell’IICSP.
Cem anos de Gianni Rodari: a criatividade é paratodos!
CICLO DE CONFERÊNCIAS ONLINE EM COMEMORAÇÃO DO CENTENÁRIO DO AUTOR
Autor e jornalista, Gianni Rodari escreveu principalmente entre as décadas de 1940 e 80, transformando-se em narrador de referência
na literatura infantojuvenil e figura querida nas escolas da Itália dos anos 70 em diante. Primeiro italiano a ganhar o conceituado Prêmio de Literatura Hans Christian Andersen (considerado o Nobel desta categoria literária), em 1970, a obra de Rodari ganhou fama pela Europa, suas histórias foram traduzidas e editadas em várias línguas, inclusive o russo, tornando-o um dos maiores autores do século XX.
O grande mérito de Rodari foi a excepcional habilidade de dialogar com a infância, no sentido de conseguir se colocar no lugar das crianças e trabalhar esteticamente a partir do que de mais libertário distingue a natureza da inteligência infantil — que um dia transformada pela experiência, pode se tornar criatividade e senso crítico na fase madura do individuo. Nessa construção, Rodari compôs uma literatura muito especial, que inovou no território da narrativa e da educação. Como na história do “Senhor maduro com um Orecchio Acerbo (ouvido verde)”, que conseguia escutar as árvores e as nuvens e entender as coisas ditas pelas crianças que aos adultos parecem misteriosas, Rodari queria escrever para todos, e acreditava que na brincadeira de ler com os filhos, adultos podem ganhar um espaço de liberdade e resgate das opressões do cotidiano. Assim acontece, por exemplo, em “Fábulas ao telefone”, em que até as atendentes da central telefônica aguardam chegar uma determinada hora do dia para ouvir a breve história que um pai conta toda noite à filha, que também espera ansiosa a ligação do pai que está sempre em outra cidade a trabalho.
É com esse propósito de criar espaço para uma escuta dupla, que Rodari, inclusive, escreve nos anos cinquenta sua coluna para adultos e crianças no Jornal italiano L’Unità, em que mantém correspondência com os pais, criando filastrocche (poeminhas rimados) a partir das diversas situações encontradas nas cartas que recebe, e subtraindo — como diz o estudioso e especialista rodariano Pino Boero — “a relação adulto-criança àquelas pesadas hipotecas pedagógicas que restringem a comunicação verbal a ‘informações úteis’ ou advertências ameaçadoras”. Se o aspecto da dúplice leitura, como jogo criativo de comunicar tanto com as crianças quanto com os adultos, é tradicionalmente explorado na estratégia da boa literatura para a infância, como nos lembra Umberto Eco a respeito do clássico “Pinocchio”, de Carlo Collodi, outro autor genial e conterrâneo de Rodari, as histórias rodarianas trazem um alinhamento novo entre o adulto e a criança, mais paritário e mais leve, em que, pela via do brincar, realidade histórica e social andam de mão dadas com a experimentação herdada das vanguardas artísticas, como o jogo do deslocamento e da invenção — tudo posto em ação pelos exercícios de uma fantasia lógica que Rodari cultiva e pratica, acreditando na possibilidade de um “mundo melhor”. O ideário deste legado da fantasia encontra-se nos registros metodológicos do famoso ensaio: “A Gramática da Fantasia. Introdução à arte de inventar histórias”, publicado em 1973, pela Editora Einaudi, e que Rodari escreve com o mesmo espírito seguro e descontraído com que apresenta a sua poética entre real e imaginário, por exemplo, nas histórias de Giovannino Perdigiorno (Joãzinho Perdidia), personagem sempre a perder-se pelo mundo fantástico de países e figuras que não existem, mas que de algum modo nos são familiares. Desta fantasia e suas construções se ocupou, também, outro grande autor, o artista e designer Bruno Munari, ele próprio intérprete visual das histórias de Rodari, com quem colaborou em notório projeto editorial, idealizado pela mesma Einaudi.
Daqueles efervescentes anos setenta para cá, sabemos, os tempos mudaram, mas o frescor da proposta rodariana, pedagógica e literária, não apenas mantem-se viva, pela originalidade artística e caráter inovador, como ganha novos sentidos no atual contexto, em que nos achamos particularmente privados de utopia e de humor. “Sem utopia não dá para ser seriamente realista, porque acabamos por sucumbir às fadigas de todos os dias. É preciso ter um projeto grande, para dar um sentido aos projetos pequenos e garantir o seu êxito”, diz o escritor. O centenário de Gianni Rodari, que acontece neste inesquecível ano de 2020, torna-se então uma bela oportunidade para festejar a criatividade, a liberdade e todas as possibilidades de projeto que estejam ao alcance de nossa inteligência. Também nos oferece uma chave para compreender a língua como fator de emancipação a que todos têm direito, que não se limita ao verbal e linguístico, mas se estende às outras expressões que integram o universo maior da linguagem, como propõe este ano a Semana da Língua Italiana no Mundo, enfatizando a importância das imagens. Buscando identificar diálogos possíveis entre culturas e com a intenção de contribuir para uma maior difusão e aprofundamento sobre a obra de Rodari no Brasil, este Ciclo de Conferências, realizado pelo Instituto Italiano de Cultura de São Paulo, em sintonia com outras iniciativas correlatas, espera promover um momento prazeroso de encontro com o legado deste escritor-inventor que marcou toda uma geração brincando com as palavras, transformando o modo de ver a infância e a escola pela via da literatura.
Michaella Pivetti, Curadora
Outubro de 2020